Pesquisar este blog

quinta-feira, 30 de abril de 2020

CORRER DESCALÇO OU CALÇADO?

É realmente melhor correr descalço? Estudo

Por , em 29.04.2020
Um estudo conduzido por Peter Francis, do Instituto de Tecnologia Carlow (Irlanda) e por Grant Schofield, da Universidade de Tecnologia de Auckland (Nova Zelândia), reuniu evidências de que usar tênis muda a forma como corremos e enfraquece nosso pé de uma maneira que pode contribuir para muitas lesões esportivas comuns.

Dos pés descalços até os tênis de corrida: um histórico

Cerca de quatro a seis milhões de anos atrás, os humanos começaram a andar de pé. Ao longo do tempo, nos tornamos caminhantes e corredores de longa distância, algo possível graças a evolução de nossos pés arqueados, tendões de Aquiles longos e capacidade de esfriar nossos corpos através da transpiração.
Claro, toda essa caminhada e corrida de longa distância era feita com os pés descalços. Pelo menos até 30 mil anos atrás, quando os primeiros sapatos apareceram no registro histórico. No entanto, somente 100 anos atrás os cientistas notaram que calçados (os usados por motivos de moda) estavam alterando o formato dos nossos pés.
No que diz respeito a tênis de corrida, estes surgiram na década de 1970, época em que o primeiro tênis almofadado foi fabricado, comercializado em massa e anunciado como um calçado que poderia impedir lesões por corrida.
Era só marketing, ou havia alguma verdade por trás disto? Pelo menos dois estudos feitos na década de 1980 corroboraram essa narrativa: um sugeriu que os tênis de corrida eram o motivo da incidência reduzida de tendinopatia de Aquiles, e outro indicou que “calçados ruins” eram um fator de risco para fraturas por estresse.

Mas…

Recentemente, no entanto, os estudos têm descoberto o contrário. Por exemplo, em uma pesquisa anterior da qual Peter Francis também participou, a equipe concluiu que crianças de 12 a 19 anos da Nova Zelândia que corriam descalças (provas de velocidade e média distância) tinham menor prevalência de dor nos membros inferiores (joelhos, tornozelos e pés) em comparação com crianças de idades semelhantes de outros países.
Outra pesquisa encontrou diferenças na estrutura e função dos pés nas populações que andam descalças em comparação com populações que usam sapatos.
Baseado nestes resultados, a dupla do novo estudo conduziu uma revisão global de lesões por corrida em homens e mulheres para tentar ter uma visão mais ampla do assunto.
Eles descobriram que 35 a 50% dos corredores se machucaram pelo menos uma vez na vida, um número considerado alto para uma espécie adaptada à corrida de longa distância. As lesões mais comuns eram nos joelhos, canelas, tornozelos e pés. A maioria foi principalmente no osso ou tecido conjuntivo, cuja função principal é ajudar a transmitir força dos músculos para permitir o movimento.

Descobertas

No geral, a dupla descobriu que, quando o pé entra em contato com o solo, a pele, os ligamentos, os tendões e os nervos passam muitas informações para o cérebro e para a medula espinhal sobre a posição exata do pé, incluindo tensão, alongamento e pressão.
É a qualidade dessas informações que permite o controle preciso dos músculos para mover nossas articulações para uma posição que absorve o impacto e limita os danos. E é por isso que correr descalço é melhor do que correr usando um tênis “especializado”.
Segundo Francis, agora na Universidade Metropolitana de Leeds (Reino Unido), os resultados de seu novo estudo sugerem que calçados permitem que os corredores “aterrissem” no chão em uma posição corporal mais ereta com uma perna estendida, levando a forças de frenagem excessivas. Isso parece desempenhar um papel em algumas das lesões de corrida mais comuns.
Além disso, o uso diário de longo prazo de calçados leva a pés mais “fracos” e frequentemente a “arcos colapsados”. Porém, esse “dano” de usar sapatos pode ser reversível. Um estudo descobriu que o tamanho e força dos músculos dos pés aumentaram apenas oito semanas após uma pessoa usar um tênis minimalista – estes são mais semelhantes a andar descalço, ou seja, não amortecem choques.
Por fim, andar ou correr descalço também é a forma mais simples de treinar e melhorar a propriocepção, que é nossa consciência da posição e dos movimentos do nosso corpo. Esse tipo de treinamento, por sua vez, ajuda na estabilidade dos membros inferiores e cria força nos pés.

Os fatores em jogo

Enquanto pessoas que correm descalças parecem de fato ter menos lesões no joelho e dor no calcanhar em comparação aos corredores que usam sapatos, elas também relatam mais lesões na panturrilha e no tendão de Aquiles.
Segundo Francis, isso sugere que as pessoas que fazem a transição muito rapidamente de correr com tênis para correr descalço podem sobrecarregar seus músculos e tendões.
As lesões podem acontecer porque quem corre descalço geralmente dá passos mais curtos e flexiona mais o quadril, o joelho e o tornozelo, além de correr mais na ponta dos pés.
Lesões de corrida são causadas por diversos fatores, incluindo idade, lesões anteriores, índice de massa corporal e mudanças repentinas no volume de treinamento, de forma que é difícil apontar o dedo para o tênis de corrida ou para os pés descalços – esses não são provavelmente os únicos culpados por machucados.  
Por fim, sapatos são uma coisa relativamente nova para nossa espécie, bem como nossos estilos sedentários de vida. É provável que esses fatores nos tornem menos condicionados a nos mover como fazíamos milhões de anos atrás.
Possivelmente, uma combinação de ficar mais ativo fisicamente, andar ou correr descalço com mais frequência e outros exercícios de condicionamento possam ajudar a prevenir lesões futuras.

Transição

Francis reconhece que abandonar o tênis de corrida pode não funcionar para todo mundo. Se você gostaria de começar a correr descalço, o pesquisador recomenda fazer uma transição primeiro, usando um tênis minimalista e andando descalço antes de correr, por exemplo.
Isso é especialmente adequado se você irá caminhar ou correr em temperaturas altas ou locais que podem ter objetos afiados no trajeto.
Vale observar que tênis minimalistas não são a mesma coisa que estar descalço, ainda que a mecânica utilizada pelos pés seja parecida, e dramaticamente diferente daquela utilizada com tênis de corrida, por exemplo.
Um artigo sobre o estudo foi publicado na revista científica BMJ Open Sport & Exercise Medicine. [ScienceAlert]


segunda-feira, 27 de abril de 2020

EXAME DE SANGUE PARA DETECTAR CÂNCER

Exame de sangue detecta mais de 50 tipos de câncer

Redação do Diário da Saúde

Exame de sangue detecta mais de 50 tipos de câncer com precisão
O DNA sem células é isolado de amostras de sangue coletadas de um paciente sem câncer (em cima) ou com câncer (embaixo) e submetido a um ensaio direcionado de sequenciação de metilação. Os resultados do sequenciamento que identificam as regiões CpG metiladas (vermelhas) ou não metiladas (azuis) são inseridos no aprendizado de máquina.
[Imagem: Allen McCrodden]
Exame de sangue para detectar câncer
Pesquisadores desenvolveram o primeiro exame de sangue que pode detectar com precisão mais de 50 tipos de câncer e identificar em qual tecido o câncer se originou - muitas vezes antes que haja sinais da doença.
O exame também conseguiu prever corretamente o tecido em que o câncer se originou em 93% das amostras.
O teste tem uma taxa de falsos positivos inferior a 1% - apenas 0,7% das pessoas seriam erroneamente identificadas como tendo câncer.
Como comparação, cerca de 10% das mulheres são erroneamente identificadas como portadoras de câncer nos programas nacionais de rastreamento de câncer de mama pelo exame de mamografia, embora essa taxa possa ser maior ou menor, dependendo do número e da frequência dos exames e do tipo de mamografia realizada.
DNA sem células
Os tumores liberam DNA no sangue, e isso contribui para o que é conhecido como DNA circulante livre, ou DNA fora das células (cfDNA: cell-free DNA). No entanto, como o cfDNA também pode vir de outros tipos de células, pode ser difícil identificar o cfDNA proveniente de tumores.
O novo exame de sangue analisa alterações químicas no DNA chamadas "metilação", que geralmente controlam a expressão dos genes. Padrões de metilação anormais e as alterações resultantes na expressão gênica podem contribuir para o crescimento do tumor, portanto esses sinais no cfDNA têm o potencial de detectar e localizar o câncer.
O exame de sangue avalia aproximadamente um milhão dos 30 milhões de locais de metilação no genoma humano. Um classificador de aprendizado de máquina (um algoritmo) foi usado para prever a presença de câncer e o tipo de câncer com base nos padrões de metilação no DNA circulante livre eliminado pelos tumores.
Em 12 tipos de câncer, que são geralmente os mais mortais (anal, bexiga, intestino, esôfago, estômago, cabeça e pescoço, fígado e ducto biliar, câncer de pulmão, ovário e pancreático, linfoma e câncer de glóbulos brancos, como mieloma múltiplo), a taxa de positivos verdadeiros foi de 67,3% nos estágios clínicos I, II e III.
Limitações
Apesar dos resultados entusiasmantes, estes são os primeiros testes do exame, e o próprio estudo tem suas limitações.
As limitações incluem: (1) todos os participantes com câncer já haviam sido diagnosticados, por meio de triagem, por exemplo, ou eram pacientes apresentando sintomas; (2) o estudo não foi projetado para estabelecer o impacto do teste na morte por câncer ou outras causas; (3) no momento da publicação destes resultados, nem todos os pacientes foram acompanhados por um ano, o que é necessário para garantir que seu status de não-câncer fosse preciso; e (4) ocorreu alguma imprecisão na detecção do tecido de origem para cânceres causados pelo papiloma humano (HPV), como câncer de colo do útero, ânus e cabeça e pescoço.
A equipe reconheceu essas deficiências e agora está utilizando-as para melhorar o desempenho do teste e de sua próxima etapa de avaliação.
Checagem com artigo científico:
Artigo: Sensitive and specific multi-cancer detection and localization using methylation signatures in cell-free DNA 
Autores: M. C. Liuy, G. R. Oxnardy, E. A. Klein, C. Swanton, M. V. Seiden
Publicação: Annals of Oncology
DOI: 10.1016/j.annonc.2020.02.011

domingo, 26 de abril de 2020

EXCESSO DE SAL e o SISTEMA IMUNOLÓGICO

Sal em excesso enfraquece o sistema imunológico

Redação do Diário da Saúde

Sal em excesso enfraquece o sistema imunológico
A equipe descobriu que o sal só nos protege de infecções na pele, mas piora qualquer outra infecção.
[Imagem: Max Germer]
Sal e sistema imune
Uma dieta rica em sal não é ruim apenas para a pressão sanguínea, mas também para o sistema imunológico.
Voluntários humanos que consumiram seis gramas adicionais de sal por dia apresentaram deficiências imunológicas pronunciadas - esse valor corresponde ao teor de sal de duas refeições tipo fast food.
Nos testes com cobaias, camundongos alimentados com uma dieta rica em sal também sofreram de infecções bacterianas muito mais graves do que seus companheiros que se mantiveram com a quantidade de sal recomendada e foram sujeitos ao mesmo processo infeccioso induzido.
Quanto de sal comer por dia?
Cinco gramas por dia, não mais: Essa é a quantidade máxima de sal que os adultos devem consumir de acordo com as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS) - corresponde aproximadamente a uma colher de chá.
Na realidade, porém, muita gente excede consideravelmente esse limite. Isso significa que pegamos o saleiro muito mais do que seria bom para nós. Afinal, o cloreto de sódio, que é o nome químico do sal de cozinha, aumenta a pressão sanguínea e, portanto, aumenta o risco de ataque cardíaco ou derrame.
Mas não é só isso: "Agora conseguimos provar pela primeira vez que a ingestão excessiva de sal também enfraquece significativamente um braço importante do sistema imunológico," explica o Dr. Christian Kurts, do Hospital Universitário de Bonn (Alemanha).
Só melhora infecções na pele
Este resultado é inesperado, já que alguns estudos apontam na direção oposta. Por exemplo, infecções por certos parasitas da pele em animais de laboratório curam-se significativamente mais rapidamente se as cobaias consumirem uma dieta rica em sal: os macrófagos, que são células imunes que atacam, comem e digerem parasitas, são particularmente ativos na presença de sal. Vários médicos concluíram a partir dessa observação que o cloreto de sódio tem um efeito geralmente melhorador da imunidade.
"Nossos resultados mostram que essa generalização não é precisa," enfatiza Katarzyna Jobin, da Universidade de Würzburg e participante da pesquisa. "Há duas razões para isso: primeiro, o corpo mantém a concentração de sal no sangue e nos vários órgãos largamente constante. Caso contrário, processos biológicos importantes seriam prejudicados. A única grande exceção é a pele: ela funciona como um reservatório de sal do corpo. É por isso que a ingestão adicional de cloreto de sódio funciona tão bem em algumas doenças da pele."
No entanto, outras partes do corpo não são expostas ao sal adicional consumido com os alimentos. Em vez disso, ele é filtrado pelos rins e excretado na urina.
E é aí que o segundo mecanismo entra em ação: os rins têm um sensor de cloreto de sódio que ativa a função de excreção de sal. Como efeito colateral indesejável, no entanto, esse sensor também faz com que os chamados glicocorticoides se acumulem no corpo. E estes, por sua vez, inibem a função dos granulócitos, o tipo mais comum de célula imune no sangue.
Os granulócitos, assim como os macrófagos, são células "matadoras". No entanto, elas não atacam parasitas, mas principalmente bactérias. Se elas não fizerem isso em um grau suficiente, as infecções ocorrerão muito mais severamente.
Checagem com artigo científico:

Artigo: A high-salt diet compromises antibacterial neutrophil responses through hormonal perturbation
Autores: Katarzyna Jobin, Natascha E. Stumpf, Sebastian Schwab, Melanie Eichler, Patrick Neubert, Manfred Rauh, Marek Adamowski, Olena Babyak, Daniel Hinze, Sugirthan Sivalingam, Christina K. Weisheit, Katharina Hochheiser, Susanne Schmidt, Mirjam Meissner, Natalio Garbi, Zeinab Abdullah, Ulrich Wenzel, Michael Hölzel, Jonathan Jantsch, Christian Kurts
Publicação: Science Translational Medicine
DOI: 10.1126/scitranslmed.aay3850



https://www.diariodasaude.com.br/news.php?article=sal-excesso-enfraquece-sistema-imunologico&id=14045

GENE DE FILTRO SOLAR e a VITAMINA D

Gene do filtro solar natural influencia como produzimos vitamina D

Redação do Diário da Saúde

Gene do filtro solar natural influencia como produzimos vitamina D
Há algum tempo os cientistas vêm alertando que o exagero no uso de filtros solares causa deficiência de vitamina D, sobretudo nas crianças. E vários estudos confirmam que a falta de luz solar e vitamina D aumenta o risco de câncer.
[Imagem: FRL/UCR]
Fator de proteção solar natural
Variações genéticas na pele podem criar um filtro solar natural.
A descoberta ocorreu quando Joana A. Revez e colegas do Instituto do Cérebro de Queensland (Austrália) estavam investigando os genes ligados à produção da vitamina D.
Os resultados sugerem que variantes genéticas no gene HAL (histidina amônia-liase) podem variar a concentração de uma pequena molécula na pele que age como um fator de proteção solar interno.
Essa molécula absorve a luz UVB - ultravioleta tipo B, a luz que nosso corpo usa para produzir vitamina D. E a quantidade dessa luz disponível para nossa pele influencia a quantidade de vitamina que podemos produzir.
"Este estudo implicou vários novos genes relacionados à pele que afetam nosso status de vitamina D - diferentes da cor da pele, que afeta nossa capacidade de produzir vitamina D, dependendo da concentração do pigmento melanina na pele," disse o professor John McGrath. "A vitamina D é o hormônio da luz do sol e precisamos da luz do sol sobre a pele para produzi-la, mas variações em nossos genes também influenciam a eficiência com que fazemos isso.
Causa ou consequência
A equipe encontrou 143 genes associados com a concentração de vitamina D em nosso corpo.
"Anteriormente, conhecíamos apenas seis regiões, então essas descobertas fornecerão novas ideias sobre como nosso corpo lida com a vitamina D," disse a pesquisadora Naomi Wray. "O estudo encontrou muitos novos candidatos interessantes que podem ajudar a nossa compreensão dos fatores que influenciam a concentração de vitamina D.
Mais do que isso, os resultados dão suporte à hipótese de que um baixo nível de vitamina D no corpo pode ser consequência de problemas de saúde, e não um fator que contribua para o risco dessas doenças. Mas essas associações terão que ser estudadas caso a caso.
"Nossas descobertas são um tesouro de pistas que manterão os pesquisadores ocupados por um longo tempo," disse Wray.
  • Checagem com artigo científico:

Artigo: Genome-wide association study identifies 143 loci associated with 25 hydroxyvitamin D concentration
Autores: Joana A. Revez, Tian Lin, Zhen Qiao, Angli Xue, Yan Holtz, Zhihong Zhu, Jian Zeng, Huanwei Wang, Julia Sidorenko, Kathryn E. Kemper, Anna A. E. Vinkhuyzen, Julanne Frater, Darryl Eyles, Thomas H. J. Burne, Brittany Mitchell, Nicholas G. Martin, Gu Zhu, Peter M. Visscher, Jian Yang, Naomi R. Wray, John J. McGrath
Publicação: Nature Communications
Vol.: 11, Article number: 1647
DOI: 10.1038/s41467


https://www.diariodasaude.com.br/news.php?article=gene-filtro-solar-natural&id=14059&nl=nlds

domingo, 19 de abril de 2020

VACINAÇÃO

Como se tornar imune a doenças?

Vidya Academics
Jan 27 · 6 min read
Texto: Wasim A. P. Syed
Revisão: Eduardo Vidal, Robson Amaral, João Henrique e Thaís Cardoso.

Quando pegamos uma doença como um resfriado, passamos alguns dias mal, com febre, inflamação na garganta e olhos lacrimejando. Todos esses sintomas são respostas do nosso sistema imune contra os vírus causadores do resfriado. Passados alguns dias, o desconforto melhora e voltamos ao normal.

O sistema imune e anticorpos

Se entrarmos novamente em contato com os mesmos microrganismos, a resposta será mais rápida e eficiente e os sintomas serão muito mais leves do que os da primeira vez, pois o nosso sistema imune entra em ação e nos adaptamos a essa invasão criando anticorpos específicos contra esses vírus.
Os anticorpos produzidos especificamente contra o agente causador da doença - ou seus elementos, os antígenos - circulam em nosso corpo como “redes de pesca”. Nosso sistema imunológico lança essas moléculas protetoras por dias e meses no nosso sangue, até reconhecer um pedaço desses vírus e neutralizá-lo.
O problema que enfrentamos com os vírus do resfriado é que, embora tenhamos contato com as mesmas espécies ao longo da vida, esses vírus sofrem variações significativas o suficiente para enganar o nosso sistema imune, a ponto deste não reconhecê-los mais. Assim, não ficamos por muito tempo imunes ao resfriado comum.
Esse exemplo pode ser usado para entender o que é o nosso sistema imune, como combatemos uma doença causada por um microrganismo e por quê, de vez em quando, desenvolvemos a mesma enfermidade.
Mas, e se houvesse uma forma de criar anticorpos contra uma doença, um microrganismo ou uma toxina sem termos uma grande chance de desenvolver os sintomas?

Induzindo anticorpos naturais

Vejamos o exemplo do tétano, uma doença causada pela bactéria Clostridium tetani. Quando alguém é infectado, os músculos do corpo se contraem violentamente até ficarem rígidos e, se essa pessoa não for devidamente tratada, há grandes chances de morte. No entanto, essa condição não ocorre somente devido à bactéria, mas à produção de uma toxina, a tetanoespasmina.
E se pudéssemos ensinar nosso sistema imune a produzir naturalmente os anticorpos contra essa toxina? Uma ideia seria dar um pequeno pedaço dela ou transformarmos a bactéria numa versão menos danosa, menos virulenta.
Bem, há algumas formas de se fazer isso. Podemos produzir uma grande quantidade dessas bactérias, isolar a toxina e aquecê-la por um tempo ou colocá-la em alguma substância que modifique a molécula até termos certeza de que não causará os mesmos efeitos que a toxina íntegra.

É seguro?

Mas como ter confiança de que essa toxina tratada não causará a doença? Podemos testar com animais pequenos, como camundongos, ou com células musculares cultivadas in vitro. Se injetarmos essa preparação nos camundongos e eles não apresentarem os mesmos sintomas, teremos mais garantia de que não nos causará um problema. E, se fizermos o mesmo com as células musculares e não houver dano algum, poderemos ficar mais otimistas com essa preparação.
O próximo passo é testar com um grupo de pessoas que vivam em uma área de risco - ou zona endêmica -, com grandes chances de serem infectadas e desenvolverem a doença. Esse é o caso dos moradores da zona rural, uma vez que essas bactérias são encontradas nas fezes de animais, no solo e na poeira. Se este grupo de pessoas receber toxina processada e, ao longo do tempo, não adquirir a doença, maiores serão as chances de proteger uma população ainda maior, mesmo aquelas que vivam em zonas urbanas, por exemplo.
Outro possibilidade é preparar alguma forma mais fraca do vírus do sarampo. Se isolarmos o vírus - que infecta somente os humanos - e o processarmos de forma que contamine apenas coelhos, por exemplo, podemos entrar em contato com essa nova linhagem do vírus e criar anticorpos contra o vírus íntegro circulante na população.
Podemos aplicar a mesma lógica de indução de anticorpos naturais contra quaisquer outras doenças, como a poliomielite e a caxumba. E, se esses microorganismos processados não forem imunogênicos o suficiente — isto é, incapazes de induzir uma resposta imune — , podemos adicionar algumas substâncias não-tóxicas aos humanos para ajudar, como o alumínio e esqualeno.
Uma ideia de gênio, não?

Como era feito

Técnica de variolação por inoculação da pústula de um paciente com Varíola, na China. Fonte: The History of Vaccines.
Essa ideia não é nova! Há mais seis séculos, as civilizações tratam doenças dessa forma, colocando pessoas em contato com uma versão mais branda para criar imunidade contra a mais grave.
Os egípcios, no séc. XIII, aplicavam uma técnica de prevenção chamada variolação contra o vírus da varíola, uma doença mortal. A técnica se espalhou pelo mundo, chegando a Índia no séc. XVI. No século seguinte, partes da África e da China já praticavam a variolação. Os curandeiros manipulavam uma lesão causada pelo vírus em um paciente com sintomas atenuados, secavam-na, transformavam em pó e inoculavam em uma pessoa saudável, através do nariz, boca ou de um corte.
Legenda: Criança com Varíola. Fonte: PHIL/CDC
Por centenas de anos, grande parte dessas populações que mantinham essa cultura se tornaram imunes à varíola, no entanto, algumas pessoas contraíam a doença e morriam da mesma forma. Com o tempo, a técnica se expandiu pelo mundo, chegando à Inglaterra no começo de 1700, e aos Estados Unidos, e desenvolveu vertentes alternativas.
Na Inglaterra, as mulheres que trabalhavam na ordenha de vacas e infectavam-se com o vírus da varíola desses animais, a Variolae vaccinae, uma vez recuperadas da versão mais branda da doença se tornavam imunes à varíola humana.
Varíola da vaca, a Variolae vaccinia. Fonte: The History of Vaccines.
Edward Jenner, um cientista inglês do século 18, estudou de forma criteriosa essa alternativa de variolação e comprovou que ela era realmente mais segura e eficiente do que a versão tradicional.
Edward Jenner. Fonte: The History of Vaccines.
Em 1796, o sucesso dos estudos de Jenner foi divulgado e replicado em outros países, e o resultado era sempre satisfatório: quem era imunizado contra a varíola da vaca, não desenvolvia a varíola humana!

As primeiras vacinas

No final do século 19, Louis Pasteur demonstrou que a inativação por aquecimento da bactéria do antraz, o Bacillus anthracis, também imunizava contra a bactéria virulenta. Pasteur atribuiu o nome de vacina a esse medicamento, em homenagem a Jenner e seus estudos com a Variolae vaccinae.
Louis Pasteur. Fonte: Wikipedia.
Hoje, de acordo com a Organização Mundial da Saúde, as vacinas salvam entre 2 e 3 milhões de pessoas por ano. Por outro lado, 1.5 milhão ainda morrem pela falta de imunização. Há mais de 15 tipos de vacinas oferecidas pelo Sistema Único de Saúde brasileiro de forma gratuita. Veja o calendario de vacinas aqui.

Vacinas previnem e eliminam doenças

Desde quando as vacinas foram introduzidas no mundo, algumas doenças comuns entre nós desapareceram dos jornais e da memória popular: em 1979, a varíola foi erradicada do mundo, e desde 1989, o Brasil e as Américas nunca mais registraram um caso de poliomielite. A poliomielite ainda existe em outros continentes, como Ásia e África, mas se a cobertura vacinal contra a doença continuar se expandindo, a tendência é que, em alguns anos, ela seja erradicada de todo o mundo, como a varíola.
Poliomielite e vacinas.
A vacinação é uma ótima estratégia de saúde pública para a imunização da população, sendo assim, devemos incentivar a sua produção e amplo acesso.
Referências:
  • Artenstein, A. W. Vaccines: A Biography. 2010. DOI: 10.1007/978–1–4419–1108–7.
  • Organização Mundial da Saúde.
  • History of Vaccines.
Vidya Academics
WRITTEN BY

Plataforma de divulgação científica formada por estudantes de áreas de ciências.