Dr. Roberto Gil, médico oncologista
Na audiência pública organizada pela Anvisa, em 6 de dezembro, em Brasília, vários representantes da área de saúde expuseram, de forma brilhante, os motivos pelos quais a indústria do tabaco precisa ter limites e ser mais regulamentada. Um dos destaques foi o dr. Roberto Gil, médico oncologista da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica e coordenador da residência em oncologia clínica do Instituto Nacional do Câncer. Para ele, é necessário diminuir, a cada ano, a prevalência de fumantes no país.
ACT: A presidente Dilma acabou por sancionar a lei 12.546 em 15 de dezembro. Nela, há aumento de IPI dos cigarros, proibição dos fumódromos e da propaganda de cigarros nos pontos de venda. O que o sr. achou dessa nova lei?
Roberto Gil: É um passo importante. Ao longo dos anos, temos acumulados medidas de regulamentação dos produtos de tabaco cujo objetivo principal é diminuir o número de fumantes. Na década de 60, não se tinha o conhecimento sobre os males do cigarro quanto se tem hoje. Agora, a população e os governos reconhecem os males que esse produto causa e, por isso, diante desse conhecimento, temos que dificultar cada vez mais o acesso ao cigarro.
ACT: E o fumante, que alega estar tendo seu direito reprimido?
RG: Antes de mais nada, temos que deixar muito claro que não estamos brigando com o fumante, mas sim com uma indústria poderosa, que usa de todos os artifícios para comercializar seu produto.
ACT: O que o sr. acha da alegação da indústria e seus aliados de que estas regulamentações vão afetar economicamente o país?
RG: No mínimo, essa alegação é antiética. É extremante pobre dizer que o fumo está incorporado na nação, inclusive no brasão da República, que foi desenhado numa época em que não se tinha o conhecimento atual. Outro absurdo é dizer que o fumicultor só sabe plantar fumo e não tem outra alternativa.
O que foi conquistado tem de ser mantido e temos que procurar avançar cada vez mais nesse sentido.
ACT: O sr. está se referindo ao perigo dos fumódromos tornarem a ser permitidos, como se cogitou no começo?
RG: A concepção do fumódromo é um absurdo tanto formal quanto teórico e as evidências mostram que não há como garantir a saúde. E destacamos ainda o trabalhador, que não escolhe estar ali naquele ambiente. A regulação do tabagismo, nesse sentido, é garantir um ambiente de trabalho saudável ao trabalhador, como acontece, por exemplo, na construção civil.
ACT: Praticamente todo esse ano de 2011 foi dominado pelo debate em torno das consultas públicas, com uma campanha massiva da indústria tentando evitá-las ou cancelá-las. Como o sr. analisa isso?
RG: A indústria tem muitas estratégias e uma delas é tirar a legitimidade dos órgãos reguladores, como a Anvisa. Foi o que tentou fazer ao longo de 2011. Nós, da SBOC, temos colaborado, junto com outras sociedades de saúde, assinando cartas e listando os motivos pelos quais nós autorizamos e reconhecemos a Anvisa a regulamentar vários produtos, como os cigarros.
Outro ponto fortemente lembrado foi a questão da liberdade, mas é impossível falar em liberdade e em livre veiculação de produtos de tabaco quando o público alvo é formado por pessoas que ainda não desenvolveram o livre arbítrio, que são os adolescentes.
Eles [a indústria do tabaco e seus aliados] tentaram entrar com liminares para impedir um debate democrático, defendendo os interesses de um segmento da sociedade e ações estabelecidas para perpetuar um negócio. Isso é um absurdo. Temos que defender os interesses da sociedade como um todo, não de um segmento.
É incrível que vemos a luta de uma indústria com um grande poder econômico e temos que parar para impedir que vençam. Eu, por exemplo, trabalho muito, e tive que separar tempo para entrar nessa luta desigual. É uma luta de Davi contra Golias.
ACT: E qual a questão que deve ser trabalhada com mais intensidade em 2012?
RG: Diminuir a propaganda e todos os atrativos dos cigarros deve continuar. Mas, na minha opinião, os aditivos são muito importante e precisamos focar neles. Como potencializadores da adição, os aditivos são fundamentais. Temos que ter uma estratégia clara para trabalhar com eles. A indústria é protelatória, portanto temos que definir prazos para a regulamentação dos aditivos. E ter como meta diminuir a prevalência dos fumantes a cada ano.
(FONTE: Boletim da ACT - 78 - Dez.2011)
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