PEC DO TRABALHO ESCRAVO ESTAVA ENGAVETADA HÁ MAIS DE 10 ANOS. E QUEM GOVERNA ESTE PAÍS HÁ MUITOS ANOS???? E ISTO VAI CONTINUAR SEM SOLUÇÃO??? |
Pesquisadores mapeiam escravidão no país
25/05/2012
Por Fábio de Castro
Agência FAPESP – Depois de mais de dez anos engavetada, a Proposta de
Emenda Constitucional 438 – conhecida como PEC do Trabalho Escravo – foi
aprovada em segunda instância no dia 22 de maio, na Câmara dos Deputados (e volta ao SENADO para discussão infindável, ao que parece! comentário acrescido).
Além desse importante passo para viabilizar a nova legislação – que prevê o
confisco de propriedades onde houver trabalho compulsório –, o combate à
escravidão no século 21 acaba de ganhar mais um aliado: o Atlas do Trabalho
Escravo no Brasil.
A publicação, produzida com base em uma extensa pesquisa realizada por
geógrafos da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e da Universidade de São
Paulo (USP), caracteriza pela primeira vez a distribuição, os fluxos e as
modalidades do trabalho escravo no país.
Além do diagnóstico, o Atlas apresenta duas novas ferramentas – o
Índice de Probabilidade de Trabalho Escravo e o Índice de Vulnerabilidade ao
Aliciamento – que poderão auxiliar na implementação da legislação e orientar as
políticas públicas de combate à escravidão.
De acordo com os autores, a publicação permitirá que o poder público avalie a
probabilidade de ocorrência de trabalho escravo em regiões e setores da economia
específicos, facilitando o trabalho de prevenção e as ações de combate ao
problema. Desde 1995, mais de 42 mil pessoas foram libertadas das condições de
escravidão pelo Estado brasileiro, de acordo com dados da Comissão Pastoral da
Terra (CPT).
Produzido por Eduardo Paulon Girardi, da Unesp, Hervé Théry, Neli Aparecida
de Mello e Julio Hato, da USP, o Atlas foi idealizado e lançado pela
organização Amigos da Terra – Amazônia Brasileira e publicado exclusivamente na
internet.
O documento incorpora os dados do Atlas da Questão
Agrária Brasileira, produzido por Girardi a partir de sua tese de
doutorado, realizada com Bolsa da FAPESP e defendida em 2008 na Faculdade de
Ciências e Tecnologia da Unesp.
Segundo Girardi, o Atlas permite traçar o perfil típico do escravo
brasileiro do século 21: um migrante do Maranhão, do norte do Tocantins ou do
oeste do Piauí, do sexo masculino e analfabeto funcional. O destino mais comum
desses trabalhadores são as fronteiras agropecuárias da Amazônia, em municípios
de criação recente, onde são utilizados principalmente em atividades vinculadas
ao desmatamento.
“O Atlas demonstra que há uma profunda ligação entre escravidão e
pobreza extrema. Não por acaso muitos trabalhadores escravizados são
provenientes do Maranhão e do Piauí, que são as unidades mais pobres da
Federação. O trabalho escravo ocorre principalmente nas propriedades cuja
localização é muito remota”, disse Girardi à Agência FAPESP.
Esse isolamento geográfico dificulta os trabalhos de verificação de denúncias
e é uma das principais características da escravidão contemporânea, segundo
Girardi. As grandes distâncias dos centros urbanos funcionam como um recurso
para impedir as fugas.
“Os outros recursos são a coerção pela violência dos jagunços, diversos tipos
de humilhação impingida a quem tenta fugir e, principalmente, o endividamento”,
disse Girardi.
“Ao ser aliciado em uma região pobre, com promessas de um salário que nunca
conseguiria ali, o trabalhador contrai a dívida relativa ao transporte ao local
de trabalho – geralmente exorbitante. Chegando ao local, é obrigado a comprar
todos seus instrumentos de trabalho, comida e moradia. A dívida se torna
impagável e a condição de escravidão se pereniza”, explicou.
O Atlas, segundo Girardi, utiliza fontes oficiais e consolidadas do
Ministério do Trabalho e da Comissão Pastoral da Terra. O detalhamento das
ocorrências é dividido por setores da economia e em todo o território
nacional.
Atividades relacionadas com pecuária ou carvão vegetal, em certas regiões da
Amazônia, estão entre os exemplos de risco muito alto de existência de trabalho
escravo.
“Obtivemos os dados do Ministério do Trabalho sobre origem dos trabalhadores
escravizados e seu destino após a libertação. Mapeamos esses dados e depois
fizemos as análises usando outras informações do setor produtivo, aliadas a
dados sobre desenvolvimento humano, condições econômicas e renda. Com isso,
conseguimos mapear os fluxos e as características sociais e geográficas dessa
população”, disse Girardi.
Miséria gera escravidão
A partir desse diagnóstico, os pesquisadores produziram duas ferramentas
inovadoras: o Índice de Probabilidade de Trabalho Escravo e o Índice de
Vulnerabilidade ao Aliciamento – sendo que o primeiro é apropriado para orientar
a prática do combate à escravidão e o segundo foi planejado para auxiliar as
ações de prevenção.
Segundo Girardi, os índices serão fundamentais para que os gestores de
políticas públicas possam traçar o planejamento para o combate à escravidão. A
expectativa é que as ferramentas também auxiliem financiadores e empresas a
evitar associações com empresários criminosos ligados ao trabalho escravo.
“Para produzir o índice de probabilidade, analisamos as principais atividades
nas quais há trabalho escravo – a pecuária e a abertura de novas áreas de
pastagens, em especial – e mapeamos as características econômicas das regiões
onde ele ocorre. Esse índice indica os municípios que têm características
semelhantes àqueles onde há trabalho escravo. Com isso, os gestores têm um
instrumento para a prática de combate à escravidão”, disse.
Enquanto isso, o índice de vulnerabilidade conjuga elementos que apontam a
fragilidade econômica e social dos trabalhadores que correm risco de
aliciamento.
Segundo Girardi, as regiões que têm características de desenvolvimento humano
precário e baixa renda semelhantes às dos focos de escravização são
classificadas como áreas com alto índice de possibilidade de aliciamento.
“Os dados mostram que o trabalho escravo no Brasil contemporâneo é
essencialmente um problema de pobreza. A miséria dessa população é explorada por
grupos de proprietários de terras criminosos, desprovidos de escrúpulos, que não
enxergam o trabalhador como um ser humano”, disse Girardi.
“Por isso, não adianta apenas aumentar a fiscalização e as ações de
libertação de escravos: para prevenção, é preciso combater a pobreza extrema.
Muitas vezes, os trabalhadores que são libertados da escravidão voltam para sua
região de origem e, sem encontrar condições para prover seu sustento, acabam
sendo escravizados novamente”, disse.
Atlas do Trabalho Escravo no Brasil: http://amazonia.org.br/wp-content/uploads/2012/04/Atlas-do-Trabalho-Escravo.pdf
FONTE: http://agencia.fapesp.br/15642
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